terça-feira, 13 de agosto de 2013



Violetta e Lucíola: a mulher como metonímia e sintoma da sociedade burguesa
Parte II


Em lugar de Lúcia: diga-se Lúcifer.
                                          (Alencar)

        Em La Traviata e Lucíola, ambas as personagens são cortesãs de luxo, como já vimos. Entretanto, seus pares apresentam algumas dessemelhanças, no caso de Alfredo Germont, trata-se de um burguês originário da região sul da França, a Provença, e no caso do personagem Paulo, um rapaz do interior que viera ao Rio de Janeiro para conhecer não só a corte, como também ter as principais experiências de sua vida.

            A primeira vez que Paulo vê Lúcia, ele a julga como angelical. Contudo, após arrebatá-lo em sua primeira noite de amor e no decorrer disto, ele passa a julgá-la como vulgar e mesquinha, vivendo sentimentos contraditórios em relação à Lúcia da cama e o anjo de luz, um misto de encantamento e repulsa... Tal sentimento contraditório que apresentam a maioria dos homens ocidentais, em que a mulher deve apresentar-se sempre pura, dependente e frágil, à semelhança da madre dei: casta ao mesmo tempo que desejam as mulheres mais vulgares para satisfazê-los.

            Lúcia também partilha desse sentimento, é uma mulher objeto, mas tem sentimentos, sofre por sua condição, sofre por ter a vida a levado aquele lodaçal. Ambos vivem os sentimentos contraditórios de cada ser humano em relação ao amor e sexualidade. Como diria Freud, uma sociedade que se reprime é uma sociedade com pornografia. O recato e a porneia caminham lado a lado, tornam-se inimigos, como se o amor puro inibisse o prazer, bem como se o prazer inibisse o amor. Ou seja, o amor Eros, erótico, natural e saudável dá lugar a essa visão porneia.

            Contudo voltando-nos ao texto, há de se destacar a diferença entre a visão das sociedades européia e brasileira, essa visão tem uma mudança sutil, sobretudo no final de uma obra e outra.

            Em La traviata, no segundo ato, Alfredo e Violetta convivem na casa de campo dela. Contudo, em um dado momento ela recebe a visita do pai de Alfredo (Giorgio), que pede que ela se afaste, pois o convívio com o, bem como para não comprometer o casamento da irmã de Alfredo, cujo noivo ameaçava romper devido ao escândalo na família.
            O mesmo se dá em Lucíola, em que a personagem vende sua luxuosa casa e foi morar em uma menor e mais modesta. Assim, em um dado momento do romance de Alencar, Lúcia, num ato de amor também afasta-se de Paulo afim de protegê-lo de comentários e escândalos, passando a ter uma atitude completamente devassa.

            Já no terceiro ato de La Traviata, Violetta, em estado terminal devido a tuberculose, recebe uma carta do pai de Alfredo; com remorso de sua atitude anterior. Contudo, ao ter de volta seu amor e a bênção do pai de Alfredo, Violetta não restitui a sua saúde.

            No romance de Alencar, em uma das visitas de amor de Paulo, Lúcia engravida e adoece devido ao seu estilo de vida, vindo a falece no parto. Percebe-se assim crítica ao moralismo e ao preconceito da sociedade. O romance entre uma concubina e Paulo parecia algo incoerente e ele se viu dividido entre o amor e o escândalo. A atração física superou essa barreira, mas até o final ela se sentia indigna do amor de Paulo e do sentimento de igualdade que deveria existir entre os amantes. Ou seja, Lúciola, assim como intitula o romance, é um tipo de mariposa que fica na lama. Ela não queria levar o seu grande amor para o lodo para o qual sua vida foi levada. Assim, esse ato de amor a purificou da devassidão. Seu corpo estava morto, mas sua alma se libertou. Esta é a grande diferença com a ópera La Traviata. 



    Anna Netrebko & Rolando Villazón em La traviata

            Na ópera de Verdi, a burguesia da época teve a sua ética ferida com o perdão do pai de Alfredo. Jamais, nem mesmo nos dias de hoje, alguma família aceitaria o casamento de um jovem burguês com uma cortesã. Tais mulheres eram descartáveis.
           
            "La Traviata" fracassou na estréia. A atitude hostil do público foi provocada pelo fraco desempenho dramático e musical dos cantores, o que evidenciou o desvio da ética burguesa contido no enredo. No ano seguinte, quando a ópera foi reapresentada, o novo elenco destacou o sacrifício de Violetta como o elemento principal do drama. "La Traviata" tornou-se então um sucesso.

Em ambas histórias observa-se algo similar. Ambas precisam morrer. Assim como a gênese, o pecado de Eva é maior que o dos homens. Ela deve carregar o salário do seu pecado – a morte. O que você acha disso leitor? Como você reagiria em uma situação similar?

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Bibliografia

ALENCAR, José de.  Lucíola. São Paulo: Ática, 1985.

BONTURI, João. Ópera "La Traviata" ajuda a conhecer sociedade urbana do século.  Folha Online Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u5641.shtml




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